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Normose: a doença do século

Se você se considera uma pessoa normal, daquelas que acha exagero em tudo que está fora de alguma norma e se preocupa arduamente em ser uma pessoa simpática disponível para agradar a todo mundo o tempo todo, cuidado, você pode sofrer de normose. A doença de ser normal. Segundo alguns psicólogos, a normose é um conjunto de hábitos considerados normais pelo senso-comum, ou consenso social, mas que provoca uma patogenia que leva à infelicidade, doenças e a perda de sentido na vida.

Este distúrbio começou a ser desenhado na década de 1980, paralelamente pelo antropólogo brasileiro Roberto Crema e pelo psicólogo francês Jean-Ives Leloup. Mas foi Pierre Weil, outro psicólogo francês, que descobriu a coincidência na pesquisa dos dois e os uniu para desenvolver esta teoria. Segundo Crema, este problema “ocorre quando o contexto social que nos envolve caracteriza-se por um desequilíbrio crônico e predominante”. Outro fato importante da normose é que ela se torna epidêmica em períodos históricos de transição, como o que vivemos atualmente, quando o que era normal passa a ser desaprovado socialmente.

Nossa sociedade já achou normal crucificar pessoas, queimar mulheres em fogueiras, escravizar pessoas, matar indígenas, forçar crianças a trabalhar, bater em mulheres e matar judeus.

Fugir desta normalidade parecia coisa absurda em cada momento em que estes acontecimentos foram registrados, mas estas rupturas trouxeram prejuízos sociais gravíssimos e consequências psicossociais ainda piores. Mas não são apenas esses exemplos que tornam a normose um problema moderno crônico.

Existe muita gente vivendo em um mundo paralelo acreditando ser necessário agir com complacência e acompanhar o que diz a maioria.

Resultado disso são os padrões que impõem regras inalcançáveis, seja de beleza, de riqueza, de opinião e até da língua falada em um país continental como o nosso. Estes dias, vi numa novela uma personagem reclamar que em sua casa se falava um dialeto, além da norma padrão da língua portuguesa, porque outra personagem expressava a variação linguística do Maranhão. Quer dizer, no Maranhão usar algumas expressões é normal, faz parte do contexto local, mas para São Paulo ou Rio de Janeiro, que determinam um padrão nacional através dos programas de televisão, esta forma de expressão foge da regra normalista expressa em suas culturas.

Esta impressão de padrão de normalidade forma sujeitos apáticos que vivem em cima do muro, sem se decidir de que lado deve pular com medo de desagradar alguém. Esta sociedade, administrada por estas regras, força o sujeito a encarar tudo com normalidade, mesmo aquilo que desagrade, como por exemplo a falta de compromisso de parte do povo brasileiro, seu comportamento no trânsito, sua corrupção. É normal, alguém diz, e sugere que você se encaixe, do contrário, corre sérios riscos de ser afastado do ciclo. O medo de ficar fora dessa linha imaginária parece ser o cerne desta discussão e o ponto culminante daqueles que sofrem, direta ou indiretamente, da normose, apesar de fazer parte do comportamento natural do homem tentar sempre se manter no bando.

Não é fácil definir quem vive ou não neste campo da normalidade patogênica, afinal o mundo segue sempre a seta da homogeneização indicada pela força motriz da indústria cultural, mas é possível identificar aqueles que não sofrem dela. São aqueles que geralmente incomodam por exporem suas opiniões, comumente formadas por argumentos contrários aos que a maioria e hegemônica cansada entende como normal. Saiu da linha, vira alvo de uma perseguição simbólica ou virtual que lhe obrigará a ceder à pressão, ou resistir ainda que lhe custe caro.

*Com informações da Superinteressante

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