O Brasil empurra seus jovens humildes para a ignorância e depois os culpa pela própria miséria quando dependem de programas assistenciais.

O Brasil, há décadas, decidiu que é mais importante formar “doutores” com diploma do que cidadãos com alfabetização, nem que seja a básica. E o resultado dessa política pública perversa, elitista e absolutamente burra está estampado em letras garrafais na mais recente Pesquisa do Indicador de Alfabetismo Funcional (Inaf): 29% dos brasileiros entre 15 e 64 anos são analfabetos funcionais.
Sim, quase um terço da população economicamente ativa é incapaz de interpretar um texto e fazer contas. Seguimos como se o problema se resolvesse com as estatísticas de um PowerPoint ministerial. É revoltante o descompasso entre os discursos progressistas e os números da tragédia. Segundo a OCDE, o Brasil gasta US$ 14.735 por aluno no ensino superior, valor similar ao de países como Alemanha e França.
E na educação básica? Míseros US$ 3.583 por estudante – um terço da média internacional. Enquanto os iluminados da Esplanada dos Ministérios defendem com unhas e dentes o orçamento bilionário das universidades públicas, onde, diga-se, a maioria dos alunos vem da elite ou da classe média alta que estudou a vida inteira em colégios particulares, a educação básica apodrece, abandonada, subfinanciada, negligenciada.
Até quando?
Ou seja, priorizamos o topo da pirâmide enquanto a base desmorona. Um investimento regressivo, excludente e, sobretudo, inútil: porque de nada adianta universidade gratuita se o aluno chega lá sem saber ler, escrever ou raciocinar com clareza. Essa distorção não é só uma falha técnica. É uma violência social institucionalizada, que condena milhões de brasileiros à informalidade, a subempregos, a jornadas exaustivas e salários indignos.
O Brasil, primeiro, empurra seus jovens humildes para a ignorância, e depois os culpa pela própria miséria quando dependem de programas assistenciais como o Bolsa Família. Enquanto formamos jovens ricos com títulos de mestrado e doutorado pagos com dinheiro público, milhões de jovens adultos pobres estão condenados à imobilidade social justamente pela precariedade da educação pública.
A quem interessa manter 29% da população funcionalmente analfabeta? A resposta é simples e indigesta: interessa aos mesmos de sempre. Ao Estado inchado que vive de repassar esmolas. Aos partidos e políticos populistas que se alimentam da ignorância. À elite acadêmica que tem horror à classe média com pensamento crítico, certo, dona Marilena Chauí? É preciso inverter essa lógica perversa urgentemente. Difícil é encontrar quem queira.